Revista + Vida 26 | Doenças do Futuro

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ENTREVISTA • HELENA CANHÃO

Claro que também há toda a parte da saúde, porque, ao envelhecer, a pessoa acumula doenças crónicas e precisa de ser tratada. No entanto, existem outros apoios que não estão na saúde mas cuja ausência faz com que as pessoas fiquem doentes. Ao nível das instituições de saúde, o que é preciso mudar? Mentalidades? A maneira de trabalhar? Acho que sim. Desde logo, é preciso olhar para o idoso como uma pessoa que tem múltiplas patologias. Nas unidades de saúde, temos de deixar de tratar a diabetes por um lado, o reumatismo por outro e a hipertensão por outro ainda. O médico da parte reumática prescreve um anti-inflamatório mas, depois, esse medicamento descompensa a tensão arterial e o cardiologista retira-o. Tem de haver mais transversalidade nos cuidados, ou melhor, tem de haver integração. A palavra correta no envelhecimento é integração. Integração de cuidados a nível horizontal, em que os diferentes profissionais de saúde têm de ajudar ao cuidado e de se articularem com o social, e integração a nível vertical, em que há boa comunicação entre o hospital, os cuidados de saúde primários e o suporte em casa. Se não tivermos essas integrações, estamos a duplicar esforços que nos fazem gastar mais dinheiro. Até agora, contabilizamos os resultados em saúde pelos atos praticados – quantas consultas, quantas cirurgias, que tempo de espera. São coisas objetivas, fáceis de contabilizar. Mas e o resultado? Podemos ter alguém que faz 100 cirurgias à próstata em que 90 desses doentes ficam com incontinência ou impotência e ter quem faça 80 e os 80 doentes ficam bem, mas quem recebe mais é quem faz as 100. Esta visão deixa de fora o resultado do ponto de vista do doente – menores efeitos secundários, maior eficácia do cuidado. É mais difícil quantificar, mas é ainda mais importante. Este conceito de cuidados integrados e cuidados centrados no doente é Patient Centered Care. Relacionado com este está o conceito de Value Based HealthCare que tem a ver com cuidados prestados cujo valor se mede pelos resultados. Ou seja, Patient Centered Care é um modelo de organização centrado no doente. O Value Based HealthCare é o modelo de avaliação dos resultados dos cuidados, que se deve medir pelo valor que acrescenta à saúde do doente e não apenas pelo número de consultas ou cirurgias efetuadas. Ambos são conceitos

Passámos, então, de uma fase em que o desafio era acrescentar anos à vida para uma fase de acrescentar vida aos anos. É mais difícil? Acho que é. Na primeira fase há um grande investimento de investigação, nomeadamente das empresas farmacêuticas, para perceber melhor os mecanismos que fazem com que tenhamos doenças ou para desenvolver medicamentos que permitam tratar doenças que, antes, eram mortais e se tornaram crónicas. Isso faz com que vivamos mais anos. Já a parte da qualidade de vida e do suporte social não beneficia desse investimento. 42 | +vida

O que cria um gap muito grande, porque, muitas vezes, as pessoas precisam é desse apoio, desde logo porque perderam autonomia. Quantas pessoas não há que vivem num terceiro ou quarto andar sem elevador e, porque não conseguem subir e descer as escadas, não vão às compras, não têm alimentos frescos e vivem completamente isoladas? São condições que não se resolvem com a toma de um medicamento. E isto é muito desafiante, porque cada vez vai ser mais difícil dar esta resposta, já que cada vez será maior a fração de pessoas que precisam deste apoio.

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