Revista + Vida 26 | Doenças do Futuro

Uma oportunidade de mudança O impacto das perturbações ansiosas é potencialmente maior em pessoas com antecedentes de depressão ou outros problemas de saúde mental. No entanto, estão a surgir muitos novos casos de perturbação psiquiátrica em pessoas sem antecedentes. Dadas as variáveis multidimensionais da resiliência humana, é difícil identificar a potencial pessoa que adoecerá mentalmente na pandemia, mas podem considerar-se populações de risco as pessoas infetadas, os seus familiares, em quarentena, com antecedentes psiquiátricos, idosos, residentes em áreas de elevado contágio, funcionários com contacto social elevado e técnicos de saúde. Curiosamente, boa parte dos pacientes já anteriormente acompanhados em consulta de psiquiatria ou de psicologia, com estratégias de autorregulação emocional aprendidas, estão estáveis ou sentem-se com níveis acrescidos de bem-estar emocional. Muitos de nós encontram na crise da pandemia a oportunidade da mudança interna. Como relembrado pelo secretário-geral da Organização das Nações Unidas, em maio deste ano, a pandemia reforça a necessidade de estarmos atentos à nossa saúde mental, historicamente negligenciada. Devemos adotar hábitos saudáveis de vida, substituir/rentabilizar emoções desconfortáveis “negativas” e partilhar dificuldades sem sentir estigma em pedir ajuda.

NUNO GOULÃO Psiquiatra, Psicoterapeuta e Coordenador de Psiquiatria Clínica na Clínica CUF Almada

Adote hábitos saudáveis Certas rotinas podem ser benéficas para evitar pensamentos menos positivos e reduzir a hipervigilância: • Limite o tempo que passa a ver notícias • Foque-se naquilo que pode, de facto, controlar • Limite um período do seu dia para preocupar-se: “a hora da preocupação” • Mantenha-se próximo de quem lhe é importante (mesmo que à distância) • Aumente a intimidade/comunicação com quem está próximo • Respeite o espaço vital dos outros, sem intrusividade, em confinamento • Siga uma rotina o mais normal possível • Mantenha-se fisicamente ativo • Adote uma dieta saudável • Assegure que mantém um sono de qualidade • Evite o consumo de álcool ou drogas Substitua emoções “negativas” Encare a pandemia como uma oportunidade de mudança interna e procure emoções positivas: • A alegria de reencontrar formas alternativas de comunicar • A felicidade de redescobrir hobbies esquecidos • Compaixão que leva a apoiar quem também tem medo • A partilha das emoções como ferramenta para uma maior proximidade Aprenda a pedir ajuda As perturbações mentais, como a ansiedade e a depressão, são problemas sérios que não devem ser ignorados. Procure ajuda se experienciar pelo menos alguns dos seguintes sintomas por um período prolongado:

EM NÚMEROS • A depressão é a terceira causa mundial de carga global de doença (a primeira nos países desenvolvidos), estando previsto que em 2030 passe a ser a primeira causa a nível mundial. • O suicídio é a segunda principal causa de morte entre os 15 e os 30 anos. • Portugal é o segundo país europeu com maior prevalência de doenças psiquiátricas. • Mais de 20% dos portugueses sofrem com perturbações psiquiátricas. • As perturbações de ansiedade são as mais comuns, afetando 16,5% da população. • As perturbações de humor, como a depressão e a doença bipolar, são as segundas mais comuns, afetando 7,9% da população. • Apenas um quarto dos doentes com perturbações mentais recebe tratamento e só 10% têm tratamento considerado adequado.

FONTE: DIREÇÃO-GERAL DA SAÚDE

• Sensação persistente de tristeza e vazio • Perda de interesse em relação a atividades outrora prazerosas • Irritabilidade e pessimismo constantes • Dificuldade de concentração • Falta de energia e cansaço

COMO TRATAR AS PERTURBAÇÕES EMOCIONAIS? O tratamento das perturbações emocionais pode ser feito por recurso a psicofármacos com poucos (ou nenhuns) efeitos adversos, prescritos por médicos de família ou por psiquiatras. A psicoterapia estruturada, realizada por psicólogos ou psiquiatras e associada ou não a psicofármacos, também é eficaz. Perante o atual contexto de pandemia, e caso não seja possível marcar uma consulta presencial com o seu psicólogo ou psiquiatra, considere o agendamento de uma teleconsulta.

• Perturbações no sono • Perturbações no apetite • Agitação ou inquietação • Pensamentos sobre a morte

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