Revista + Vida 23 | A preparar campeões para a vida

“A prática regular de exercício físico é a melhor medicação que podemos fazer.”

ou manter a massa muscular, a aumentar a massa óssea – ou pelo menos a diminuir a sua perda, atuando como forma de prevenir a osteoporose – e a força muscular, e até a melhorar o metabolismo em repouso, a função imunitária e o atraso de certos processos de envelhecimento. Por fim, o exercício está igualmente associado a uma melhoria nos estados de depressão e ansiedade e a um acréscimo da autoestima e da sensação de bem-estar. E, como resume o médico Miguel Medalhas Cardoso, “se as pessoas tiverem um estilo de vida saudável ao longo da vida terão melhores condições de saúde durante o envelhecimento”. Elas dão o exemplo Com uma lista tão vasta de benefícios, seria de esperar que grande parte da população fosse adepta de uma prática desportiva regular. Contudo, é cada vez mais difícil arrancar os portugueses do “conforto” do sofá. De acordo com dados do Eurobarómetro revelados pela Direção-Geral da Saúde no início do ano, o número de portugueses com 15 ou mais anos que raramente praticam ou nunca praticaram exercício físico atingia os 74% em 2017. Um valor que, por estranho que pareça, até representa uma subida face aos 66% registados em 2009. Ao mesmo tempo, entre a população que contraria a tendência e não desiste de se manter ativa, há tendências dignas de nota. “Houve um boom no mundo do fitness , nas mulheres, e em trails [corrida todo-o-terreno] e desportos de resistência nas pessoas com mais de 65 anos”, revela Miguel Medalhas Cardoso, que lamenta a falta de interesse demonstrado pela restante população e sobretudo pelas camadas mais jovens. “Já não brincam tanto na rua, estão a perder um pouco de cultura desportiva e têm uma maior tendência para a obesidade. Há uma maior limitação no espaço, as redes sociais acabam por fazer com que as pessoas vivam numa bolha e não exercitem nem as suas capacidades físicas nem as sociais.” O médico Ricardo Antunes partilha da mesma opinião: “O mundo digital e a evolução tecnológica podem ter contribuído para que existam outros interesses e uma falta de tempo a dedicar ao exercício físico regular. O próprio dia a dia de hoje, comparado com o dos nossos antepassados, revela uma diminuição no esforço físico diário, nomeadamente na deslocação para o trabalho, nas nossas casas ou na utilização de elevadores em vez de escadas.” O ortopedista alerta ainda para outras ideias pré-concebidas sobre o exercício: “Muitas vezes, nas consultas, sinto que há uma perceção de que a atividade física é demasiado dispendiosa.” Referindo-se à cada vez maior adesão feminina à prática desportiva, nomeadamente em modalidades como o fitness e o crossfit , Miguel Medalhas Cardoso avança algumas explicações: “Hoje a mulher tenta treinar de forma igual – ou melhor – do que o homem. É uma tendência transversal em termos de idades. O fitness acaba

Miguel Medalhas Cardoso Médico especializado em Medicina Desportiva na Clínica CUF Almada e no Hospital CUF Santarém

por funcionar como um desafio para a mulher, que se sente mais autónoma, independente e bem tanto em termos estéticos como no seu dia a dia.” O médico garante que, tanto nas mulheres como nos homens, os desafios colocados na prática desportiva acabam por servir de motivação nos restantes campos da vida. É também o aumento do desafio, em conjunto com o prazer da atividade ao ar livre, que o médico Miguel Medalhas Cardoso aponta como causas para o aumento da popularidade dos trails , inclusive entre a população sénior. “As pessoas sentem-se bem a fazer uma atividade ao ar livre, com vários tipos de intensidade. É um estímulo exuberante para que a pessoa se sinta bem, com um estilo de vida saudável, e para a sua concretização e inserção social.”

Mais vale prevenir

Se é verdade que o desporto traz desafios que promovem uma sensação individual de superação, também é um facto que pode ser fonte de lesões musculares e problemas cardiovasculares caso a pessoa o pratique sem estar devidamente preparada. Daí a importância do acompanhamento profissional durante e mesmo antes do início da prática do exercício físico. Miguel Medalhas Cardoso, que além de médico foi atleta de alta competição – judoca desde os cinco anos, é hoje médico das seleções nacionais de ginástica e karaté –, não tem dúvidas sobre a importância da prescrição de exercício físico por um médico de Medicina Desportiva. “É preciso perceber a biomecânica de cada indivíduo e o tipo de pessoa que temos à frente. A idade não é relevante: se uma pessoa faz desporto desde os cinco anos, tem boa performance e aos 80 quer fazer trails , não é preocupante. Agora, se nunca fez nada e aos 50 quer fazer 130 quilómetros de trail , é necessário fazer as coisas gradualmente.” Um médico de Medicina Desportiva vê a pessoa como um todo, incluindo o tipo de modalidade que quer fazer, a duração e a intensidade. “Na primeira consulta tenta-se perceber a história clínica

+vida _ julho 2019 | 21

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